terça-feira, 9 de setembro de 2008

Um gigante ocioso


Carlyle Paes Barreto

carlyle@jc.com.br

Patrícia Alves

pbarbosa@jc.com.br

Mundão, Colosso, Gigante do Arruda. Os adjetivos são vários para o estádio do Santa Cruz. E quase sempre utilizados de forma positiva. Mas o maior orgulho da torcida coral vem sendo um problema a mais nesta crise que parece sem fim. Este ano, deu mais prejuízo do que lucro, transformando-se num peso extra para a direção do clube.

Ultrapassado, a exemplo da maioria das praças esportivas do Brasil, o Arruda parou no tempo. Apesar de ser o estádio mais novo da capital pernambucana (construído em 1972), não recebe mais jogos internacionais. O último foi há 13 anos, no amistoso em que a seleção brasileira venceu a Polônia por 2x1.

O local também não foi concebido para abrigar outros eventos, embora já tenha sido alugado para a encenação da Paixão de Cristo do Recife, de evento evangélico e até para o show do grupo musical Menudo, no início da década de 80. Uma megaestrutura que ficou ociosa. Principalmente agora, com o time profissional em férias prolongadas.

“O Santa Cruz não construiu o Arruda. Ganhou de presente e não tem condições de mantê-lo”, admite o próprio presidente tricolor, Edson Nogueira, Edinho, referindo-se ao fato de o governo do Estado ter bancado a construção e, depois, as ampliações.

Edinho, bastante questionado pelo desempenho do time dentro de campo, sofreu com falta de manutenção do José do Rego Maciel, que culminou com a interdição do anel superior durante toda Série C do Campeonato Brasileiro. Mais prejuízo.

“Contávamos com 30 mil lugares da Campanha Todos com a Nota, mas, com a interdição, tivemos que trocar apenas 15 mil bilhetes”, lembra o superintendente do clube, Luís Cláudio. “E esses ingressos rendiam ao Santa R$ 3,5 cada. Mas com impostos e taxas, ficavam apenas R$ 2 por bilhete. É impossível fazer futebol assim.”

A situação tomou proporções inadministráveis com a campanha do time no Nacional. Para os últimos jogos, os atletas passaram a treinar apenas em um expediente, pela manhã, por conta da falta de energia. Os vestiários ficavam mais escuros à tarde. Não havia dinheiro nem para comprar o óleo diesel que abastece o gerador. Na semana passada, parte dos jogadores chegou a tomar banho, após o treinamento, com a água da piscina do clube. O fornecimento d’água também está cortado.

“Como o clube deve mais de R$ 500 mil à Celpe, o jeito foi passar a utilizar geradores, o que duplica o gasto mensal com energia. Com a energia elétrica eram R$ 20 mil por mês, agora, só com o aluguel dos geradores, chegamos a gastar R$ 30 mil, em média, fora o óleo diesel”, explica o superintendente.

O Santa desembolsa mais de R$ 50 mil com a folha de pagamento dos funcionários administrativos. O custo total para manter o Arruda é R$ 100 mil por mês, levando-se em conta também os departamentos de futebol profissional e amador, sem contar com salários de atletas. A receita de sócios não passou dos R$ 90 mil. “No mês passado, havia 3.121 sócios em dia. E deve diminuir”, resigna-se o dirigente. “O maior desafio é agora. Sem receita, sem salários e com a barriga vazia.”

Luís Cláudio ressalta que o clube aprendeu a manter o estádio com uma receita pouco moderna: as doações. “Mas elas dependem muito do desempenho do time dentro de campo. Agora piorou. Tivemos até que liberar os juniores até outubro. O prejuízo só faz aumentar”, reclama. “É um patrimônio que o Santa tem e não consegue manter”, completa.

PROPOSTA POLÊMICA

O publicitário José Nivaldo Júnior, ex-conselheiro coral, defende o arrendamento do Arruda. Ele gostaria de ver o estádio José do Rego Maciel entregue a empresários. “Se o Santa Cruz não consegue manter o Arruda deveria fechar a sede, alugar tudo aquilo para algum grupo. Os dirigentes passariam a gerir o clube numa sala no prédio da própria Federação Pernambucana”, sugere.

“É como administrar uma cidade”


Administrar o Mundão pode ser como dirigir uma pequena cidade. Os gastos mensais com iluminação, água e funcionários do Arruda são comparados aos de uma prefeitura de um município de 30 mil habitantes, como Vicência, por exemplo, na Zona da Mata do Estado. Além de uma subestação de energia elétrica, são mais três geradores, quatro poços artesianos, cinco reservatórios d’água, 45 banheiros, 112 funcionários administrativos e mais 18 exclusivos da Comissão Patrimonial.

“Comparo o Arruda à uma miniprefeitura. O tamanho, a forma funcional e a distribuição das tarefas se parecem”, explicou o ex-presidente do Santa Cruz João Caixero. Porém, o tricolor de hoje o permite comparar à uma cidade falida já que os “impostos” recolhidos são oriundos de um futebol decadente. “É complicado manter toda essa estrutura sem o futebol funcionando. Essa é a grande dificuldade. O Arruda é administrável, mas a receita depende da representatividade do futebol em campo”, justificou Caixero.

O complexo do José do Rego Maciel inclui uma concentração para 25 profissionais, com 10 quartos com TV a cabo, chuveiro elétrico e ar-condicionado. Além de cozinha industrial, sala de vídeo, sala para palestras, sala de internet, academia, sala de fisiologia, consultório odontológico (que nunca foi utilizado), departamento médico reformado e lavanderia.

Também há uma concentração para os juniores que abriga até 30 atletas, no entanto, as obras de reforma estão paradas.

Mesmo com uma das maiores torcidas do Brasil, o Santa Cruz não possui lojas próprias do clube em seu estádio. Há apenas uma arrendada. As outras, que eram alugadas, foram destruídas durante a administração de Edinho para a construção de um ponto do Habib’s, o que nunca aconteceu. Em temporadas melhores, segundo Caixero, o Santa Cruz vendia cerca de 800 mil camisas oficiais. Hoje, os números são irrisórios. Até o projeto de um campo para futebol society sofreu com o abandono e nunca foi concluído. “Permaneceu o campinho que mais parece um campo de subúrbio. Só areia”, diz o superintendente Luís Cláudio.

O Santa também possui débito antigo de fornecimento de alimentação com o Bar do Galvão, por isso o estabelecimento não paga aluguel ao clube.

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