A Cobra Coral desceu três divisões desde 2006
O Santa Cruz conseguiu um feito inédito na história do futebol brasileiro: ser rebaixado por três anos consecutivos. O time pernambucano, que estava na Primeira Divisão em 2006, jogou a Segundona em 2007 e a Terceirona neste ano. Com uma campanha ruim, não conseguiu ficar entre os 20 que disputarão a reformulada Série C do ano que vem. Sobrou para ele a recém-criada Série D - isso se conseguir se classificar, segundo critérios que ainda serão adotados pela Federação Pernambucana.
O rebaixamento foi confirmado nesta quarta-feira, a uma rodada do fim da segunda fase, com a goleada do Caxias sobre o Brasil de Pelotas.
- Era mais fácil chover dois meses no sertão do que o Santa Cruz sair dessa - resignou-se o volante Alexandre Oliveira, ao saber do resultado em Caxias do Sul.
O Santa Cruz, fundado em 1914, já conquistou o Campeonato Pernambucano 24 vezes (mais do que o Náutico, que tem 21 títulos, e menos do que o Sport, com 37). O time ocupa a 21ª colocação do ranking da CBF, logo à frente do rival Náutico, que está na Primeira Divisão.
Queda livre tem sido freqüente no Brasileirão
Despencar da Primeira para a Terceira Divisão em apenas dois anos tem sido freqüente no Campeonato Brasileiro. A maldição nos últimos anos começou com o Criciúma, que foi rebaixado em 2004 e em 2005. O segundo foi o Paysandu, com quedas em 2005 e 2006. O Santa Cruz passou pelo mesmo processo e ainda deu azar de ver o poço ficar mais fundo, com a criação da Série D.
Dois times podem manter a fila andando. Paraná e América-RN, que deram adeus à elite em 2007, estão mal na Série B deste ano. O primeiro já está entre os quatro últimos colocados (em 18º lugar), e o segundo tem boas chances de entrar na zona de rebaixamento na noite de sexta-feira.
Site do Santa exibe mensagem de apoio após o rebaixamento no ano passado
Apenas a partir de 2001 o Campeonato Brasileiro viu se estabilizarem o sistema de rebaixamento e a disputa em três divisões. Antes disso, era comum a competição não ter times rebaixados ou sofrer viradas de mesa. O Fluminense, assim como acontece agora com o Santa Cruz, também teve três rebaixamentos seguidos (1996 e 1997 na Série A e 1998 na Série B), mas só os dois últimos valeram.
A CBF já divulgou o calendário para a temporada de 2009, com a inclusão da Série D. A competição - assim como acontecia com a Série C até este ano - terá seus times determinados por critérios das federações estaduais.
O declínio do Santa Cruz no Campeonato Brasileiro
Primeiro rebaixamento (2006): o pior na elite
Contra o Vasco, a pior derrota: 4 a 0 em casa
Campanha: foi o lanterna entre os 20 times, com sete vitórias, sete empates e 24 derrotas (marcou 41 gols e sofreu 76).
Pior derrota: 4 a 0 para o Vasco, no Arruda.
Principais jogadores: Jorge Henrique, Carlinhos Bala e Márcio Mixirica.
Prévia: na Copa do Brasil, o Santa passou raspando na primeira fase, contra o Vila Aurora (MT). Em seguida, foi eliminado pelo Vitória. No Pernambucano, o time sofreu uma dolorosa derrota na final. Após perder para o Sport por 2 a 1 na primeira partida, o Tricolor arrancou uma vitória por 1 a 0 no segundo jogo, com um gol no finzinho. Na disputa por pênaltis, entretanto, deu Sport.
Segundo rebaixamento (2007): na Série B, queda na reta final
Derrota para o Criciúma em reta final desastrosa
Campanha: ficou em 18º lugar, com dez vitórias, 12 empates e 16 derrotas (47 gols a favor e 65 contra). O time despencou na reta final - nas últimas 11 rodadas, acumulou sete derrotas e quatro empates.
Pior derrota: 6 a 0 para a Ponte Preta, em Campinas.
Principais jogadores: Marcelo Ramos, Kuki e Carlinhos Paraíba.
Prévia: foi eliminado logo na primeira fase da Copa do Brasil, com duas derrotas para o Ulbra Ji-Paraná (RO). No Pernambucano, ficou em sexto lugar. O consolo foi ter o artilheiro pela segunda vez seguida, com Marcelo Ramos sucedendo Carlinhos Bala.
Terceiro rebaixamento (2008): eliminação no meio do caminho
Jogadores se reúnem para uma corrente
Campanha: classificou-se com dificuldade na primeira fase, num grupo com Campinense-PB, Potiguar de Mossoró-RN e Central-PE. A uma rodada do fim da segunda fase, está na lanterna, atrás de Salgueiro-PE, Icasa-CE e Campinense-PB. Dezesseis times continuarão na disputa.
Pior derrota: 3 a 0 para o Potiguar de Mossoró, no Rio Grande do Norte.
Principais jogadores: Rosembrick e Sandro.
Prévia: foi eliminado novamente na primeira fase da Copa do Brasil, desta vez pelo Fast (AM). A campanha no Pernambucano não foi menos vexatória: ficou em sétimo lugar entre 12 times e foi obrigado a disputar o hexagonal da morte para fugir do rebaixamento.
Rivais lamentam queda do Santa Cruz
Presidentes de Sport e Náutico dizem que fracasso do Tricolor representa o enfraquecimento do futebol pernambucano
Bernardo Ferreira
Rio de Janeiro
Jogadores do Santa Cruz se reúnem antes do apito do juiz: time não se manteve na Série C
Nada de tripudiar. O momento desesperador vivido pelo Santa Cruz, rebaixado para a Quarta Divisão, foi motivo de lamentação nos rivais Sport e Náutico, que estão na elite do futebol brasileiro. Os presidentes dos dois clubes disseram que a queda do Tricolor é um baque para o futebol do estado e do Nordeste. No ano que vem, o Santa terá ainda de confirmar sua participação na Série D, de acordo com critérios a serem adotados pela Federação Pernambucana.
- Um clube se fortalece quando seus rivais estão fortes, pois faz com que não baixe a guarda. A queda do Santa Cruz é muito ruim para Pernambuco e para o Nordeste - lamenta Maurício Cardoso, do Náutico.
Milton Bivar, do Sport, tem opinião igual, mas ressalta que os torcedores não pensam da mesma maneira.
- A torcida não perde tempo. A gozação predomina, o que é normal no futebol.
Na verdade, nem mesmo os torcedores rubro-negros são unânimes em festejar a desgraça alheia. No site de relacionamentos Orkut, na maior comunidade do time, alguns lamentavam a perda de prestígio do clássico e demonstravam até pena. A maioria, no entanto, comemorou.
A rivalidade ainda fez com que o atacante Kuki, do Náutico, preferisse não lamentar ou mesmo comentar a situação do Santa.
- Alguns torcedores do Náutico podem pegar no meu pé depois - justificou o jogador, que participou do rebaixamento do Santa Cruz na Série B em 2007.
Dirigente diz que Sport é modelo para o Santa
Milton Bivar vê o futebol pernambucano mais fraco, mas não acha que seu clube seja atingido pela crise do rival. Segundo ele, o principal problema será a polarização entre Sport e Náutico na briga pela hegemonia em Pernambuco, já que "o Santa Cruz não terá condições de montar um time em condições de brigar por título".
O dirigente, que imagina que o orgulho impediria o rival de aceitar qualquer ajuda do Sport, vê seu clube como modelo para que o Santa Cruz saia dessa situação.
- Na área administrativa e financeira, podemos servir como modelo, sim. Temos uma política de pés no chão que diminuiu o número de ações na Justiça contra o clube.
O Sport é o atual campeão da Copa do Brasil e por isso tem vaga assegurada na Libertadores do ano que vem. No Brasileirão, ocupa uma posição intermediária na tabela de classificação - atualmente é o décimo colocado. Já o Náutico, em 18º, corre o risco de rebaixamento.
Os presidentes dos dois rivais estão juntos no lamento e também na esperança de que o Santa Cruz volte aos seus melhores dias.
- O clube tem força, tradição e torcida. O caminho a percorrer é mais longo, mas ele voltará à elite - aposta Maurício Cardoso.
Time de Quarta, torcida de Primeira
Santa Cruz tem a oitava melhor média de público entre os times das Séries A, B e C do Brasileiro, à frente de São Paulo, Vasco e Atlético-MG
Bernardo Ferreira
Rio de Janeiro
A melhor atuação do Santa Cruz na Série C do Campeonato Brasileiro aconteceu na arquibancada. A torcida levou ao estádio do Arruda quase 20 mil pessoas por jogo, apesar da má campanha do time, que foi incapaz de ficar entre os 20 melhores e acabou rebaixado.
Torcida foi sempre em bom número ao Arruda e acompanhou o time mesmo fora de casa
- O Santa Cruz hoje só tem uma coisa boa: a sua torcida. Ela é impressionante, maravilhosa - elogia o ex-jogador Ricardo Rocha, que defendeu o Tricolor no início da carreira, em 1983 e 1984.
A média de 19.894 torcedores por partida deixa o Santa Cruz na oitava colocação entre as 103 equipes que disputaram as Séries A, B e C. Está na frente de vários grandes que estão na elite, como São Paulo, Palmeiras, Vasco, Botafogo, Fluminense e Atlético-MG.
Por outro lado, não supera o rival Sport, que tem média de público um pouco superior: 21.639. Essa derrota na arquibancada reflete o melhor momento vivido pelos rubro-negros nos últimos anos. De acordo com as últimas pesquisas, o Sport já tem o triplo de torcedores do Santa em Pernambuco (e o dobro em Recife).
- O amor que o torcedor do Santa Cruz tem pelo seu time é comparável ao de Flamengo e Corinthians. Se o Santa chegasse às fases finais da Série C, ia ter público de Série A - compara o meia Alexandre Oliveira.
Os campeões de público em 2008 no Campeonato Brasileiro
Time | Divisão | Jogos | Média de público | Média de renda |
1º Flamengo | 1ª | 11 | 37.013 | R$ 641.899 |
2º Grêmio | 1ª | 12 | 30.166 | R$ 569.950 |
3º Inter | 1ª | 11 | 22.600 | R$ 293.150 |
4º Corinthians | 2ª | 11 | 22.012 | R$ 430.121 |
5º Sport | 1ª | 11 | 21.639 | R$ 252.374 |
6º Coritiba | 1ª | 11 | 21.379 | R$ 340.129 |
7º Cruzeiro | 1ª | 12 | 20.889 | R$ 304.122 |
8º Santa Cruz | 3ª | 6 | 19.894 | R$ 99.193 |
OBS: Computados os jogos realizados até o dia 3 de setembror |
Sonho de infância é frustrado em meio à pior fase da história do clube
Jogador, que esperou até os 29 anos para vestir a camisa do time do coração, participa do capítulo mais triste da história do Santa Cruz
Bernardo Ferreira
Rio de Janeiro
Alexandre vira Guerreiro na bandeira da torcida
Alexandre Oliveira esperou até os 29 anos para ver seu sonho de infância realizado: vestir a camisa do Santa Cruz. Mas 2008 será sempre lembrado por ele com tristeza. O pernambucano de Igarassu, que freqüentou muito a arquibancada do Arruda quando era garoto, viu de perto o time do coração escrever o pior capítulo da sua história, com o rebaixamento para a recém-criada Série D do Brasileirão.
- É a pior fase do clube desde a fundação. Não tem como ser pior. Antes não tinha para onde ir, mas agora inventaram a Série D. Se o time não tem recursos para disputar a Série C, imagina a D - lamenta o jogador (agora aos 30 anos), que chegou no início do ano e, graças à identificação com o clube, ganhou uma rara homenagem da torcida: uma bandeira personalizada.
Em São Paulo, torcida pelo rádio
O volante também presenciou a classificação do Santa Cruz para a elite do futebol brasileiro, em 2005. Ele estava em campo quando o time venceu a partida que valia vaga na Série A, mas do lado adversário. Na época, vestia a camisa da Portuguesa, que perdeu por 2 a 1 em Recife.
- Foi uma situação difícil. O Arruda estava lotado, com a torcida fazendo festa. Mas sou profissional e fiquei triste.
Nos dois anos seguintes, ainda defendendo a Lusa, acompanhou pela internet e pelo rádio o Santa Cruz sendo rebaixado na Série A e depois na Série B. Enquanto isso, o time paulista conseguia a sua volta à elite no Paulistão e no Brasileiro. Sem acordo para renovar o contrato no fim de 2007, Alexandre foi passar férias em Pernambuco e acertou com o Santa Cruz.
Jogador diz que Santa se tornou clube perdedor
- A minha idéia era disputar só o estadual. Mas o bicho foi pegando, e a minha vontade de sair dessa situação aumentava - conta o jogador. - Eu gostaria de comemorar o acesso à Série B. Outros jogadores vão embora, mas minha família é daqui, mora na Ilha do Itamaracá (na Grande Recife). Vou ouvir falarem desse rebaixamento para sempre.
Para Alexandre, a troca de treinadores e o entra-e-sai de jogadores contribuíram para o terceiro dos rebaixamentos do Santa Cruz.
- O trabalho começou com o Fito Neves, e com ele chegaram vários jogadores. Depois entrou o Bagé. Vieram mais alguns jogadores, mas ele disse que não tinha sido ele a formar o grupo. E isso gerou mal-estar - opina o jogador. - Não adianta: quando vem coisa ruim, é uma atrás da outra.
A única coisa boa do Santa Cruz na Série C, segundo Alexandre, foi a participação da torcida. Para ele, o apoio vindo da arquibancada evitou um vexame ainda maior, a eliminação na primeira fase.
- O Santa sempre esteve acostumado a grandes jogos e a disputar títulos. Mas se tornou um clube perdedor - lamenta.