De Márcio Markman
Em Recife
A crise que atinge o Santa Cruz parece não ter fim. A cada dia, um novo acontecimento afunda o Tricolor do Recife, um dos clubes de maior tradição do futebol brasileiro e um dos de maior torcida no Nordeste. Na semana passada, os amantes do time pernambucano acompanharam a saída do meia Carlinhos Paraíba, talvez o único atleta de qualidade inquestionável do elenco e que significou um reforço de apenas R$ 200 mil para os combalidos cofres da agremiação pernambucana.
Também foram obrigados a assistir a estréia do Tricolor no "hexagonal da morte", que definirá os dois rebaixados para a segunda divisão estadual. É a maior crise desportiva do Santa Cruz. Do segundo semestre de 2006 para cá, o clube caiu da Serie A para a Série C, foi eliminado duas vezes na primeira fase da Copa do Brasil, para adversários de pouca expressão - Ulbra/RR e Fast Clube/AM - e o máximo que conseguiu no Campeonato Pernambucano foi o 6º lugar do ano passado.
A crise no futebol coincide com uma das poucas alegrias que os torcedores tricolores tiveram nesse período, que foi a eleição do delegado de polícia e ex-preparador físico e gerente de grandes clubes do País, Edson Nogueira, que passou pelo próprio Santa Cruz, Náutico, Sport e Corinthians. Contrariando as previsões, ele derrotou o ex-presidente Romerito Jatobá e encheu a todos de esperança. Hoje, Edinho, como é mais conhecido, ostenta o título de um dos piores presidentes que já passaram pelo clube.
Ele sabe disso. "Hoje, estou sendo julgado pelo futebol. Nada de administrativo, de estrutura está valendo para esse julgamento. E eu espero reverter isso. Se eu levar o Santa Cruz para a Série B, passo a ser um dos melhores presidentes que passaram pelo clube. E eu discordo dessa forma de avaliação. Não vale eu ter arranjado um ônibus, ter reformado a concentração, ter feito uma cozinha industrial para atender ao futebol, um vestiário moderno, nada disso. Agora, o time não está rendendo", resigna-se o dirigente.
A seu favor, Edinho diz que administra o clube de forma diferente dos presidentes que passaram pelo clube a partir da década de 90. Nesse período, o Santa Cruz passou a acumular uma dívida que bateu a casa dos R$ 80 milhões, quando o atual presidente assumiu a gestão. "Se houvesse essa fórmula de disputa do Brasileiro desde aquele tempo, com Série A, B, C, o Santa Cruz estaria na 'Y'. Se eu estivesse pensando só em mim, não estava preocupado em não deixar débitos. Eu trabalho para que meu sucessor não receba o clube como eu recebi", garantiu.
Segundo o presidente, o próximo comandante do clube receberá um plantel de pelo menos 20 profissionais formados pelo clube, todos com os direitos federativos presos ao Santa Cruz até pelo menos o final do próximo ano. "Que não vinguem os 20, vinguem 5. Que estoure ao menos um. Está salva a situação do Santa Cruz. A minha situação eu posso mudar em nove meses", explicou.
Mas o torcedor quer saber é de resultado. Se não conseguir voltar à Série B este ano, o Santa Cruz terá que, no Campeonato Pernambucano de 2009, fazer o que não conseguiu nos dois anos de gestão Edinho. Caso contrário, terá que paralisar suas atividades a partir do final de abril. Não seria o caso de tentar equilibrar os aspectos administrativo e desportivo? "Nós tentamos. Mas os profissionais que dirigiram o clube deram azar. A gente contrata o maior craque do planeta e quando ele entra no Santa Cruz desaprende. Mas vamos conseguir montar um time com Fito Neves. Ele é melhor que os outros? Não, mas não é possível que o azar dure para sempre".
Ainda assim, o dirigente alerta aos poucos torcedores que ainda dão como provável a volta do Santa Cruz à Série B. "Ser da Série C para quem não faz parte do Clube dos 13 é diferente. Bahia, Vitória, Fluminense voltaram, mas é diferente. Ou o Santa Cruz parte para construir o Centro de Treinamentos, a sua fábrica de jogadores, para diminuir os erros nas contratações, ou a coisa não anda".
E a prova do que Edson Nogueira fala sobre contratações pode ser comprovada pela sua própria experiência. No início deste ano, ele anunciou uma parceria com a empresa do tetracampeão mundial e ex-jogador do Santa Cruz, Ricardo Rocha, como a salvação do futebol do clube. Bastou um turno para que nada menos que 15 jogadores (nem todos da empresa do ex-jogador) tivessem deixado o Arruda e a parceria fosse desfeita. Edinho justifica que essa era a única saída para o Santa Cruz poder participar do PE-08.
"Quem, em todo o mundo, rejeitaria uma parceria como essa? Pelo conhecimento, pelo homem, pelo tricolor que é Ricardo Rocha. Que vinha de uma parceria bem-sucedida com o CRB, no ano passado. Eu acreditei totalmente nele e ele deve ter acreditado em quem indicou os 15 jogadores que ele trouxe. Mas se os jogadores dele não tivessem vindo, não tinha campeonato. Ricardo não ganhou um copo d'água do Santa Cruz, que só gastou com passagens e hospedagem dos atletas. Ainda assim, temos cinco atletas trazidos por ele que podem fazer parte do grupo", avaliou Edinho.
Enérgico e falastrão, o presidente do Santa Cruz diz que não é de ficar de lamentações. Repetiu ao menos mais duas ou três vezes o mantra de que vai tirar o Santa Cruz da crise desportiva nos próximos nove meses. E que, para que isso ocorra, mantém a rotina de passar o dia inteiro dentro do clube. A única hora em que revelou uma mágoa desse período em que está à frente do Tricolor do Arruda, foi ao comentar o estigma de centralizador que passou a ostentar.
"Me sinto agredido com isso. Porque a minha vida inteira eu deleguei tarefas, em qualquer trabalho que tive. No Santa Cruz, eu dei espaço, e foram muitos espaços. Agora, chega muita gente com idéias mirabolantes. Um dia chegou uma pessoa dizendo que colocaria sete indústrias dentro do clube. Eu disse 'você está nomeado diretor das suas idéias'. Eu não preciso só de idéias, preciso de gente que as execute. Eu gasto R$ 14,6 mil por semana para abrir os clubes, sem contar os salários. E esta semana entraram cerca de R$ 300,00. Qual a empresa que sobrevive assim, com 20% do que entra bloqueados pela Justiça", indagou.
Esta noite, o torcedor do Santa Cruz vive mais um capítulo dessa verdadeira novela que já dura mais de dois anos. O time enfrenta o Porto, pela segunda rodada do "hexagonal da morte", a partir das 20h30, no Arruda. Busca a vitória para abrir vantagem para a zona de rebaixamento à segunda divisão estadual. O Tricolor está há oito jogos sem vencer pela competição.
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